Sou um mentiroso (verdade)! Mas nem toda mentira é pecado (será)

sexta-feira, 24 de junho de 2011 Postado por Lindiberg de Oliveira



Leia aqui a primeira parte.
O Diabo se encontra na porta da necessidade.
Caio Fábio
O mentiroso mais bem sucedido é aquele que acredita em sua própria mentira. Pessoas assim fazem uso da mentira da forma mais deslavrada. Esse tipo de gente deforma a realidade de forma tão habituada que nem percebem quando o fazem. Como eu disse na primeira parte do texto, os narcisistas fazem parte desse grupo que mentem para se autopromoverem, desejando sempre ser o melhor em tudo – o mais belo, o mais inteligente, o mais rico. Numa ótica evolutiva isso se torna interessante, porque o desejo de levar vantagens sobre nossos semelhantes nos torna mais aptos a sobreviver.
Mas umas das amplas questões sobre a mentira é se ela é verdadeiramente necessária. A mentira é realmente imprescindível para que haja certo tipo de harmonia no universo? Kant (1724-1804) diz que não, “que devemos ser sempre vorazes. Se não formos verdadeiros uns com os outros, não haverá confiança, que é a base da sociedade”. Benjamin Constant (1767-1830) rebate Kant de forma contundente. Constant pergunta a Kant: “sou obrigado a dizer a um assassino onde se escondeu sua vítima? Não deveria mentir?”.
Kant responde de forma atrapalhada, e vê dificuldades no assunto. Seu posicionamento não chega a ser incoerente, mas ainda assim prefiro me ater aos valores defendidos por Constant, quando diz que “existem mentiras necessárias”, reiterando que verdades e mentiras são sempre relações sociais. Diante disso, não creio que seja pecado ou antiético que um marido diga para sua mulher que ela esteja bonita apenas para agrada-la. Ou quando mentimos para nossas crianças quando perguntam de onde vêm os bebês.  Ou que, diante da morte, eu venha mentir para salvar minha vida – isso aconteceu com Davi. Com medo do que Aquis lhe poderia fazer, Davi fingiu-se de louco diante dos filisteus e, no final deu o crédito para o Senhor por tê-lo livrado. Pedro, também mentiu para que poupassem sua vida – apesar do contexto ser totalmente diferente. Pedro negou o próprio Cristo horas depois de ter jurado que se possível morreria com seu mestre. Jesus por sua vez, se mostra inflexível em relação à mentira, dando à ela total paternidade ao Diabo:
Vós tendes por pai ao diabo, e quereis satisfazer os desejos de vosso pai. Ele foi homicida desde o princípio, e não se firmou na verdade, porque não há verdade nele. Quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira (João 8.44).
Nesse caso, a mentira está ligada à morte (homicídio) e a calunia – roubar matar e destruir; esses são os fins de toda ação maligna. Do verso 44 em diante Jesus se opõe às investidas dos fariseus, que tentavam denegrir sua imagem a todo custo quebrando assim um dos mandamentos de Deus: “não dirás falso testemunho contra o teu próximo”. Não quero dizer com isso (e nem creio) que Jesus tenha feito uso de algum tipo de mentira, mas a verdade é que o Novo Testamento trata a mentira com certa rigidez ao ponto de levar à morte o casal Ananias e Safira, que deixou explicitamente que Satanás os dominassem, agindo de forma avarenta associada à hipocrisia (desejo de manter uma falsa imagem de santidade). A Escritura segue advertindo:
O que usa de fraude não habitará em minha casa; o que profere mentiras não estará firme perante os meus olhos (Salmos 101.7).
Não mintais uns aos outros, pois que já vos despistes do homem velho com os seus feitos, e vos vestistes do novo, que se renova para o pleno conhecimento, segundo a imagem daquele que o criou (Colossenses 3.9-10).
Pelo que deixai a mentira, e falai a verdade cada um com o seu próximo, pois somos membros uns dos outros (Efésios 4.25).
Finalmente, o que a Bíblia condena é a mentira como forma de calunia, fraude e difamação. Somos estimulados em todo tempo a trapacear, a obter vantagens sobre o nosso próximo e até mesmo sobre Deus. Nesses contextos a mentira se torna uma grande arma do maligno, talvez a mais letal de todas.

©2011 Lindiberg de Oliveira