A face de Deus*
segunda-feira, 19 de setembro de 2011
Foi como se um flash de luz me cegasse. Quando abri os olhos o que vi foi um ambiente totalmente alheio e jamais visto por mim em tempos pretéritos. De imediato percebi que meus pés estavam descalços, e a areia o qual eu pisava flamejava como se fosse ouro. A vegetação era alegre, e as cores que irradiava de tudo aquilo estavam embriagadas por vida.
As fragrâncias emanadas pelo ambiente eram as mais diversas possíveis. Os pássaros, a água, o ar, tudo isso era peculiar. O cenário era de uma praia, talvez uma ilha, com uma beleza jamais penetrada nos meus olhos, fazendo meus sentidos perceber tudo isso como se cada unidade fosse um universo à parte, mas ao mesmo tempo cada universo eram às minhas faculdades como uma pequena partícula integrada num todo. O lugar parecia ser obscenamente sagrado, fazendo-me colocar-se como o único ser impuro ali.
Eu não sabia como tinha chegado ali. Tudo parecia real demais para um sonho, e também me sentia vivo demais para ter dado o último suspiro. Alias, vivo era a única definição que poderia dar a alguém caso me perguntasse como você está. Sentia minha carne preguiçosamente revigorante, fazendo-me entender que isso não vinha de mim, e sim de tudo aquilo que o ambiente emanava. “É o paraíso”, pensei. E isso me deixou bem confortável, pois, se aqui é o paraíso, então há salvação para os animais. Ora, quanto mais eu andava, mais eu me deparava com bichos de espécies nunca vista por mim antes. Insetos que me davam terror, agora eu os admirava com apaixonante desânimo. E foi então que pude sentir que não só os animais e as plantas, mas exatamente tudo naquele lugar, cada partícula, estava querendo expressar e transmitir algo. “Não é o paraíso”, pensei novamente, “é Deus, estou dentro do próprio Deus”. Era como se eu soubesse a particularidade de cada grão de areia que tocava em meus pés, de cada sopro que atingia meu rosto, de cada átomo que fazia parte do meu corpo.
Não sabia o que pensar, tudo era indefinível. Todo meu conhecimento foi fragilmente quebrado pelo fabuloso reino das formigas com asas, que me instigavam a refletir com suas lições. Prostrei-me com o rosto em terra e confiantemente, na certeza de estar sendo ouvido, disse em pensamento aquilo que só Deus poderia escutar. De repente toda aquela paisagem translúcida foi substituída por uma megalópole manipulada por suas tecnologias. As arvores deu lugar a prédios e arranha-céus, as aves foram substituídas por aeronaves. O mar e todo seu esplendor se transformaram em esgotos espalhados pela cidade. Enfim, nem se toda aquela beleza fosse virada pelo lado do avesso se decomporia em algo tão sombrio.
Ainda prostrado, não mais com o rosto em terra – ou areia –, mas sim em um asfalto frio, de uma cidade fria, onde moravam pessoas frias. Ao me levantar surpreendi-me, pois o quadro o qual eu estava agora era pintado com tintas diferentes. Eu me encontrava numa calçada, suja e deserta. O céu estava cinza, nublado, alias, tudo estava cinza.
Ao me virar me deparei com um velho decrepito, sujo e seminu, jogado sob a imundícia misturada com caixas de papelão em plena avenida da cidade. Nunca tinha visto alguém naquelas condições pessoalmente; era nitidamente visível que seu corpo era insanamente maltratado pela fome, seu sorriso desdentado era totalmente deselegante e sua pele fétida espantava qualquer pessoa que chegasse perto dele. Atraído pelo resplendor daquele velho, resolvi me despir e cobrir a sua nudez.
Imóvel, sem conseguir dar um passo sequer, gastei meus últimos minutos desfrutando o bem estar de seu cativeiro, e então acordei do sonho sem que eu pudesse estender a mão em sua direção. Assustado, pensei comigo mesmo: “Não foi um sonho. Eu vi, realmente vi a face do Todo Poderoso”.
As fragrâncias emanadas pelo ambiente eram as mais diversas possíveis. Os pássaros, a água, o ar, tudo isso era peculiar. O cenário era de uma praia, talvez uma ilha, com uma beleza jamais penetrada nos meus olhos, fazendo meus sentidos perceber tudo isso como se cada unidade fosse um universo à parte, mas ao mesmo tempo cada universo eram às minhas faculdades como uma pequena partícula integrada num todo. O lugar parecia ser obscenamente sagrado, fazendo-me colocar-se como o único ser impuro ali.
Eu não sabia como tinha chegado ali. Tudo parecia real demais para um sonho, e também me sentia vivo demais para ter dado o último suspiro. Alias, vivo era a única definição que poderia dar a alguém caso me perguntasse como você está. Sentia minha carne preguiçosamente revigorante, fazendo-me entender que isso não vinha de mim, e sim de tudo aquilo que o ambiente emanava. “É o paraíso”, pensei. E isso me deixou bem confortável, pois, se aqui é o paraíso, então há salvação para os animais. Ora, quanto mais eu andava, mais eu me deparava com bichos de espécies nunca vista por mim antes. Insetos que me davam terror, agora eu os admirava com apaixonante desânimo. E foi então que pude sentir que não só os animais e as plantas, mas exatamente tudo naquele lugar, cada partícula, estava querendo expressar e transmitir algo. “Não é o paraíso”, pensei novamente, “é Deus, estou dentro do próprio Deus”. Era como se eu soubesse a particularidade de cada grão de areia que tocava em meus pés, de cada sopro que atingia meu rosto, de cada átomo que fazia parte do meu corpo.
Não sabia o que pensar, tudo era indefinível. Todo meu conhecimento foi fragilmente quebrado pelo fabuloso reino das formigas com asas, que me instigavam a refletir com suas lições. Prostrei-me com o rosto em terra e confiantemente, na certeza de estar sendo ouvido, disse em pensamento aquilo que só Deus poderia escutar. De repente toda aquela paisagem translúcida foi substituída por uma megalópole manipulada por suas tecnologias. As arvores deu lugar a prédios e arranha-céus, as aves foram substituídas por aeronaves. O mar e todo seu esplendor se transformaram em esgotos espalhados pela cidade. Enfim, nem se toda aquela beleza fosse virada pelo lado do avesso se decomporia em algo tão sombrio.
Ainda prostrado, não mais com o rosto em terra – ou areia –, mas sim em um asfalto frio, de uma cidade fria, onde moravam pessoas frias. Ao me levantar surpreendi-me, pois o quadro o qual eu estava agora era pintado com tintas diferentes. Eu me encontrava numa calçada, suja e deserta. O céu estava cinza, nublado, alias, tudo estava cinza.
Ao me virar me deparei com um velho decrepito, sujo e seminu, jogado sob a imundícia misturada com caixas de papelão em plena avenida da cidade. Nunca tinha visto alguém naquelas condições pessoalmente; era nitidamente visível que seu corpo era insanamente maltratado pela fome, seu sorriso desdentado era totalmente deselegante e sua pele fétida espantava qualquer pessoa que chegasse perto dele. Atraído pelo resplendor daquele velho, resolvi me despir e cobrir a sua nudez.
Imóvel, sem conseguir dar um passo sequer, gastei meus últimos minutos desfrutando o bem estar de seu cativeiro, e então acordei do sonho sem que eu pudesse estender a mão em sua direção. Assustado, pensei comigo mesmo: “Não foi um sonho. Eu vi, realmente vi a face do Todo Poderoso”.
©2011 Lindiberg de Oliveira
*Ao Kallil, que vive me dizendo que ir direto ao assunto é sempre mais fácil.
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