A importância do corpo
domingo, 8 de abril de 2012
O corpo é um elemento que há muito tempo é estudado,
avaliado, e também desprezado. O dualismo platônico, com o conceito do mundo
das ideias, trouxe para o pensamento cristão muitos males que, talvez, poderão
ser irredimíveis se não agirmos numa breve posteridade. Talvez eu esteja me
adiantando caro leitor, por isso, vamos nos ater a um raciocínio mais
cronológico.
O pensamento grego, tendo sido influenciado em
grande parte por Sócrates, começou a ver que esse mundo físico e palpável, era
apenas um reflexo de um mundo mais perfeito, invisível e imaterial. Platão, que
sistematizou todo o pensamento de Sócrates, chamou esse mundo de "o mundo
das ideias". Os gregos acreditavam que a essência do ser humano é a alma,
que brotava desse mundo. O corpo é uma prisão, apenas uma casca, dizia Platão.
Acreditavam que o corpo era perecível e efêmero, diferente da alma, imperecível
e eterna. Por pensar assim é que Sócrates rejeita se defender diante dos seus
inimigos, na esperança de que a morte seria pra si uma libertação, pois no
pensamento socrático, eu não sou o meu corpo, e sim, essencialmente a minha
alma, imutável e imperecível.
Você, distraído leitor, pode perceber que em grande
parte esse pensamento não se difere muito do pensamento cristão dominante. Mas,
levando em consideração os ensinamentos bíblicos, vamos compreender que há uma
diferença abissal entre os princípios bíblicos e o pensamento grego – também
chamado de racionalismo socrático ou neoplatonismo.
Paulo Brabo, comentando a obra de Alan F. Segal, Life After Death, diz “que os gregos
falavam da vida eterna em termos de imortalidade da alma; os judeus e os
primeiros cristãos falavam da vida eterna em termos de ressurreição do corpo”.
Ou seja, as Escrituras e os primeiros cristãos nos ensinam que o corpo seria
preservado para a vida eterna, pois não somente a alma, mas também o corpo é
parte essencial do que somos.
A morte não é, portanto, uma libertação do corpo, a
qual os gregos consideravam como uma prisão. A esperança bíblica é que seremos
ressuscitados, e nessa brincadeira encontraremos remição e a verdadeira
plenitude do corpo. E isso simplesmente por que eu sou o meu corpo, e logo, sem
corpo não há como ser.
O meu corpo define a minha existência. Por isso,
quando alguém é tomado como desaparecido, logo o damos como morto, pois, se não
há corpo não há vida. Jesus sempre associava a vida ao corpo. Não é por acaso
que Cristo deu sempre uma total importância a curas e ressuscitações. Ed René
Kivitz disse que a atenção de Jesus ao corpo pode ser entendida de duas
maneiras: “Primeiro como denúncia profética da condição humana que resulta da
rejeição a Deus. As curas de Jesus são de fato uma dramatização exterior da
restauração da identidade humana. [...] As curas físicas operadas por Jesus
apontam também para o fato de que a redenção é essencialmente o resgate da
plena identidade humana, o que necessariamente implica a redenção também do
corpo”. A partir daí entendemos que o corpo não é apenas o físico, a carne,
resumidos apenas em sentidos sensoriais. Para Jesus, o corpo é o conjunto da
existência em todas as suas dimensões, especialmente as dimensões do coração.
O problema do pensamento grego, é que levaram muitos
cristãos a ansiar por outro mundo que transcende esse mundo físico, outrora
chamado de "mundo das ideias", agora pelos cristãos, chamado de Céu
ou Paraiso. A contradição nisso tudo está em que, Deus, com toda sua pompa e
poder, relegou todo o conforto do Céu para habitar no mundo. E os cristãos por
outro lado, desdenham o mundo para habitar no Céu. Jesus não desprezou o mundo,
não renunciou a carne e não rejeitou a matéria. Foi esse o mundo que Deus amou
de tal maneira, foi nele que Deus habitou, e foi por ele que Deus morreu.
Entregou-se em carne e sangue e ressuscitou gloriosamente com todos os seus
estigmas, apontando exatamente para uma elevação do corpo, representando a verdadeira
– ou integral – identidade do que se pode chamar humano.
©2012
Lindiberg de Oliveira
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