O que morre nunca se apaga
quinta-feira, 31 de maio de 2012
O mais improvável de todos os encontros aconteceu entre as duas aves mais antagônicas possíveis: o Cisne e a Fênix. Acampado na garganta do abismo, pausando de vez em quando de amar, dançar e trabalhar, a Fênix resplandecia o seu brilho através de mais uma ressureição. Aliás, essa seria a sua última.
O
Cisne chega diabolicamente magnífico, como se fosse um anjo. Suas asas eram
admiráveis, a cor e a suavidade de suas plumas contemplavam a perfeição. Os
ventos e os ares pareciam dançar para a admiração de seu pouso.
-
Eu te amo – disse o Cisne –, sei que causei a sua morte, mas, eu te amo.
A
Fênix, que acabara de ressuscitar das cinzas, tinha em suas penas ainda
labaredas de fogo.
-
Você está em mim, e essa é minha impertinência. Você se encontra em todos os
caminhos dos meus pensamentos, em cada esquina das minhas lucubrações, mas,
apesar disso, não quero deixar minha felicidade depender de algo que eu possa
um dia perder – o fogo se revolvia nas penas da Fênix deixando-a visivelmente
como um ser sagrado.
-
Não fale assim – o Cisne se dobrou diante da Fênix –, deixei tudo simplesmente
para está ao seu lado, pois, somente ao seu lado me sinto quente, somente as
suas chamas me livrará de uma vida fria e congelante. Prostro-me diante de ti,
e te peço que consulte o teu coração antes de qualquer decisão.
Lágrimas
saíram dos olhos do Cisne, mas, se petrificaram em gelo antes que atingisse o
chão.
-
Você é muito esperto, Cisne – disse a Fênix, sem nenhuma expressão
significativa –, pois, sabe muito bem que meu coração por ti queima, e com
certeza ele não te negará perdão. Mas, você me matou, e esse é meu último ciclo
de vida. Não há garantias de que não serei morto novamente.
-
O que morre nunca se apaga – disse o Cisne, não conseguindo olhar pra outro lugar
a não ser os olhos da Fênix –. Sua felicidade longe de mim será o meu calvário,
e minha alegria em sua ausência será o seu tormento, e isso porque somos o
combustível um do outro. Você sente a necessidade de dizer e ouvir que te amo,
que você faz falta, e essas declarações é a brisa que mantem as brasas
queimando, e o toque é a força propulsora que faz o motor da nossa alma girar,
gerando assim energia, beleza e o encanto inefável que transcende o campo do
pretexto.
O
vento do abismo começou a soprar, apagando assim, toda chama que banhava a
Fênix. Suas penas ao vento, de cores vermelhas e dourados, faziam a própria beleza
dizer “sim senhor!”.
-
Eu te amo – disse o Cisne ainda prostrado, com lágrimas cada vez mais gelado –,
e estou disposto a ultrapassar todas as linhas imposta por você. Não quero te
perder de novo, pois, ficar sem você seria como ficar sem minhas asas. Não será
fácil esquecer teu sorriso, o sentimento, a paixão que ficou. Serão pra sempre
os mesmos encantos.
-
Apesar de todas as complicações e embaraços, entendi que a distância gera em
nós mais a união do que o afastamento em si, e, diante disso, temos apenas duas
opções – disse a Fênix com medo de suas próprias palavras –, primeiro, acabamos
isso agora, e alguém sairá machucado. Segundo, acabamos com isso depois, e
alguém sairá machucado.
O
Cisne, se afastando, olhou fixamente para a Fênix, e cristais saíram de seus olhos,
pois, fazia todo sentido o que a ela acabara de dizer.
E
seria uma ilusão pensar nisso de outra forma.
Eles
sabiam que ambos se completavam, pois, traziam equilíbrio um ao outro. Mas
também se machucavam, trazendo dor um ao outro. As chamas majestosamente se
inflamaram sobre a Fênix, deixando-a suntuosa. O Cisne, aproximando, colocou
sua cabeça embaixo das asas da Fênix. Os dois ficaram ali, indeterminadamente
sem se mover, somente com seus pensamentos e receios.
©2012 Lindiberg de Oliveira
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